Temos que falar da Xiaomi

Temos Que Falar Da Xiaomi 1

Sabemos que no lançamento de um celular as empresas oferecem várias correções rapidamente, e se mostram dispostas a ouvir a comunidade. Os chefes de desenvolvimento e marketing sorriem para as câmeras e a vida é feliz como uma propaganda de margarina. Após 3 meses esta lua de mel é encerrada e os consumidores começam a enxergar a verdade: bugs, falta de atualizações e as reclamações começam a pipocar por este mundão véio sem porteira.

A euforia do lançamento é uma cortina de fumaça feita para agradar somente acionistas e a mídia. Você já viu um site de review analisar uma atualização da ROM original do aparelho com a mesma dedicação e destaque do lançamento? Muito raro, certo?

Comprar um celular no lançamento é como casar sem conhecer o noivo(a). Após alguns meses é que os problemas aparecem e não há como voltar atrás.

Sabedoria popular da Internet

E aí que a coisa toda começa a pegar para a Xiaomi: este é o único foco dela. Ela é uma empresa de “vitrine”, ou seja, lança muita coisa só pra gringo ver e só mostra esforço no lançamento, depois é cada um por si.

Claro que ela não é a única, não é uma marcação com a empresa chinesa de nossa parte, mas ela tem que ser posta a escrutínio como todas as suas concorrentes foram, pois hoje ela é a terceira maior fabricante de celulares do mundo com 11% de market share (a Apple lidera com 21% seguida pela Samsung com 16%).

Custo-benefício

A empresa fez fama divulgando que seu modelo de negócios era inovador: celulares com ótima performance e recursos com preços mais acessíveis que seus concorrentes. A política de preços era simples e transparente: “Nossa margem de lucro é de apenas 5%”. Nunca antes uma empresa de tecnologia oferecia esse discurso e transparência aos mercado. Uma nova revolução de modelo de negócios se apresentava.

Como exemplo vamos voltar para 2018 e utilizar um dos produtos de maior sucesso da empresa, o Pocophone F1, apelidado de “Flagship Killer” – SoC top de linha para a época (Snapdragon 845) e preços de smartphone intermediário.

Muito bom para ser verdade! E todo mundo comprou a ideia, achou que o aparelho era imbatível com seu custo-benefício e ninguém percebeu o óbvio: ele custava o que deveria custar. Para entendimento, por via de regra, vejam os quatro itens mais caros que compõem o custo de fabricação de um celular:

  1. Tela;
  2. Chipset (ou SoC);
  3. Câmera;
  4. Corpo.

Todo o resto dos materiais usados na fabricação de um smartphone correspondem de 5% até 15% do custo total. Se analisarmos friamente o exemplo do Pocophone F1, veremos que perto de todos os outros concorrentes “Flagships” com o mesmo SoC Snapdragon 845 ele não tinha:

  1. Tela Amoled de boa resolução;
  2. Frequência LTE Cat 20;
  3. NFC;
  4. Quick Charge 4.0;
  5. Câmera com boas especificações (traseira e frontal);
  6. Som estéreo;
  7. Carregamento sem fio;
  8. Carcaça de metal;
  9. Resistência a água.

Ora, mas para ter um custo acessível era necessário que a Xiaomi cortasse alguns recursos, certo? Concordamos, mas como dissemos anteriormente, devido à hierarquia de custos de fabricação de um celular, a empresa vendeu gato por lebre. Vejam uma curiosa comparação com seu irmão (quase gêmeo) Mi 8 (ou Mi 8 PRO na versão global);

Mi 8 (PRO) – preço de lançamento: $ 420 (dólares)

CorpoEstrutura de alumínio, Gorilla Glass 5 na frente e atrás
Tela6,21 “Super AMOLED, resolução de 2.248 x 1.080 pixels, 402 ppi; compatível com HDR 10 e DCI-P3.
Câmera traseira12 MP primário, sensor Tipo 1 / 2,55 “, tamanho de pixel de 1,4 µm, abertura f / 1,8, PDAF de pixel duplo, OIS; 12 MP secundário, sensor Tipo 1 / 3,4″, abertura f / 2,4, foco automático; 
Zoom 2x. 
2160p / 30fps, câmera lenta 1080p / 240fps.
Câmera frontal20 MP, tamanho de pixel de 0,9 µm, abertura de f / 2.0; 
Gravação de vídeo 1080p / 30fps.
Chipset (SoC)Qualcomm Snapdragon 845: CPU octa-core (4×2,8 GHz Kryo 385 Gold e 4×1,7 GHz Kryo 385 Silver), GPU Adreno 630.
Memória6 GB de RAM; 
Armazenamento de 64/128/256 GB; 
sem slot microSD.
Bateria3.400mAh Li-Po (selada); 
QuickCharge 4.0+ de carregamento rápido.
ConectividadeDual-SIM; 
LTE-A, agregação de portadora de 4 bandas, Cat.16 / 13 (1 Gbps / 150 Mbps); 
USB-C; 
Wi-Fi a / b / g / n / ac; 
GPS de banda dupla; 
Bluetooth 5.0
especificações de lançamento

Pocophone F1 – preço de lançamento: $ 300 (dólares)

CorpoEstrutura de plástico, verso em Kevlar ou plástico, frente em Gorilla Glass não especificado.
TelaLCD IPS de 6,18 “, resolução de 2.246 x 1.080 pixels, 403 ppi.
Câmera traseira12 MP primário, sensor Tipo 1 / 2,55 “, tamanho de pixel de 1,4 µm, abertura f / 1,9, PDAF de pixel duplo; 5 MP secundário – servindo como sensor de profundidade. 2160p / 30fps, 1080p / 240fps em câmera lenta.
Câmera frontal20 MP, tamanho de pixel de 0,9 µm, abertura de f / 2.0; 
Gravação de vídeo 1080p / 30fps.
Chipset (SoC)Qualcomm Snapdragon 845: CPU octa-core (4×2,8 GHz Kryo 385 Gold e 4×1,7 GHz Kryo 385 Silver), GPU Adreno 630.
Memória6/8 GB de RAM; 
Armazenamento de 64/128/256 GB; 
slot microSD (híbrido).
Bateria4.000 mAh Li-Po; 
Carregamento rápido QuickCharge 3.0.
ConectividadeDual-SIM; 
LTE-A, agregação de portadora de 4 bandas, Cat.16 / 13 (1 Gbps / 150 Mbps); 
USB-C; 
Wi-Fi a / b / g / n / ac; 
GPS de banda dupla; 
Bluetooth 5.0; 
Radio FM
especificações de lançamento

Destacamos as principais diferenças em negrito nas tabelas acima. Considerando que o Pocophone custava 30% menos que o Mi 8 no seu lançamento, mas que todos os itens que compõem o maior custo de fabricação foram “capados”, é fácil observar que, apesar do preço menor, a margem de lucro é maior no “Flagship Killer”.

Este exemplo serve para ilustrar uma prática que a Xiaomi aplica até hoje, fingir (ou mentir) que aparelhos de baixo ou médio custo são mais baratos e trazem benefícios únicos frente aos concorrentes. Assim dá pra perceber que não há mágica, somente o velho e bom ilusionismo de marketing para o consumidor. Mas o que passa essa falsa impressão ao mercado? Para essa resposta é necessário entender outros fatores que afetam o preço e disponibilidade de um produto.

A cadeia de produção, distribuição e demanda

Mas por que o mercado e a mídia percebem os modelos da Xiaomi com uma relação de custo-benefício competitiva ou até vantajosa? A velha e boa mentira deslavada do capitalismo: Lei da oferta e da procura.

Não vamos explicar o que é essa lei, por favor deixem de preguiça, cliquem no link e se informem, mas vamos apontar como isso afeta a percepção de valor dos produtos da Xiaomi com um único argumento: Produção e Distribuição.

A Xiaomi tem um modelo próprio que busca economia em toda a cadeia de produção e distribuição. Suas fábricas são extremamente simples, pequenas e enxutas, a maioria de seus parceiros para fabricação é local e sua mão de obra se encontra principalmente na China e Índia, onde o custo é quase de graça para os padrões globais. Pela regionalização nas parcerias tem abundância de componentes a disposição, com logística rápida e barata e isso possibilita a venda de aparelhos on demand, ou seja, sem estoque e somente online.

“Ah, nomore, mas eu vejo numa loja online (acho que daquela ex apresentadora do vídeo show – Suiça Guimarães) e outras concorrentes que há estoque.”

Nos reservamos no direito de não comentar esta dúvida

Entendendo como é o processo de fabricação fica a questão: como colocar para vender esses aparelhos no mundo todo? Ora, se o seu produto é igual ao de seus concorrentes (usa os mesmos insumos e parceiros), mas custa menos, é só aproveitar a expansão irrefreável e gigantesca do comércio eletrônico (e market places) com muitas lojas online e pouca diversidade de produtos disponíveis. Sem contar países subdesenvolvidos que possuem alta demanda por produtos com preços mais populares já que são explorados por mercados com poucos concorrentes (carteis). Assim você minimiza o custo da operação ao extremo e aumenta competitividade. Claro que não podemos esquecer da cadeia logística, mas como estamos falando de uma empresa chinesa, ela têm milhões de parcerias locais e internacionais com décadas de experiência em exportação para o mundo inteiro.

Como o modelo de venda é totalmente voltado para exportação e online, com toda a fabricação global centralizada na China e Índia, é só abastecer os mercados globais e não se preocupar com toda a salada russa de taxações que cada país impõe. Juridicamente este movimento é questionável, mas praticamente todas as empresas atuam assim, não é uma exclusividade da Xiaomi.

A última parte que faltava nesta complexa equação é como saber se os consumidores comprariam seus produtos. A Xiaomi começou como uma ROM customizada para o Android em fórums chineses e no próprio XDA em meados de 2010. Após conquistar milhões de usuários já em suas primeiras versões da MIUI, mesmo sem nenhum aparelho desenvolvido, a empresa construiu a demanda que precisava para a venda de seus dispositivos, afinal o software é o que dá personalidade, a um dispositivo.

o bugui miui

Voltando para os dias atuais, apesar de toda a origem da empresa ser para a criação da MIUI, a Xiaomi é extremamente displicente com as versões atuais. Desde o lançamento da MIUI 10, em junho de 2018, a empresa se perdeu. A outrora elogiada MIUI 9 (Android 4-8) lançada em agosto de 2017, deu lugar para MIUI 10 (Android 6-9) que além de pesada, era cheia de bugs, com alto consumo de bateria e lenta.

A empresa reconheceu seus erros (afinal, merda acontece com qualquer uma) e prometeu desenvolver uma atualização profunda que resolvesse todos os problemas.

O que é um peido para quem está cagado?

A solução para o cocô MIUI 10 foi o cocô mole MIUI 11 (Android 7-10), lançada em outubro de 2019. A empresa conseguiu piorar o “impiorável” e as reclamações em suas comunidades próprias começaram a atingir níveis alarmantes. E cada nova atualização da MIUI 11 só lambuzava mais a imagem do desenvolvimento.

Rapidamente a empresa resolveu tomar algumas decisões:

  • Reduziu para somente celulares flagships versões Beta públicas;
  • Aumentou o número de APPs embarcados com propagandas não solicitadas;
  • Não lançou atualizações das versões do Android para dispositivos elegíveis com MIUI 10 e 11;
  • Decretou o fim de vida (suporte e atualizações) para diversos celulares com apenas um ou dois anos de vida;
  • Começou a ignorar reclamações de usuários em suas comunidades e pela Internet.

Claro que houve muito mais problemas do que os listados acima, afinal uma empresa que faz pouco caso com a opinião de seus clientes só gera muito mais problemas. Mas para tentar manter uma imagem de empresa que se importa, admitiu os problemas da MIUI 11 e se comprometeu (de novo) a melhorar a sua solução de software com uma nova e grande atualização, incorporando alguns modelos que já tinham sido abandonados.

O público foi ao delírio, a expectativa cresceu, a Xiaomi apresentou prévias com recursos visuais totalmente renovados, Wallpapers Interativos, mais performance, mais bateria, mais celulares compatíveis e uma data de lançamento: 27 de abril de 2020. Quando finalmente o dia chegou, o cocô mole se tornou a diarréia que acomete os usuários até hoje, chamada MIUI 12.

Se a Xiaomi desenvolvesse vacinas para covid, seguindo a lógica do desenvolvimento da miui, ela teria criado um vírus ainda mais perigoso.

Nós mesmos

Aquecimentos aleatórios, queda de performance, elementos visuais que não aparecem ou encaixam na tela, funções prometidas ausentes, enfim um grande e fétido shitshow no qual não há previsão de solução, afinal a empresa nem mais se dá ao trabalho de se comunicar ou anunciar nada. Somente moderadores e colaboradores (fans ou funcionários disfarçados) de comunidades da própria empresa tentam administrar o problema.

mas o hardware não é bom?

Bom, apesar de todos os problemas em relação ao suporte de software e dispositivos já lançados, a empresa lança a cada bimestre incontáveis modelos (e remarcações) de dispositivos para diversos mercados e nichos de mercado que se possa pensar – do high ao low end, mas sem o mesmo sex appeal do custo-benefício que criou uma legião de fãs.

Em 7 de março de 2019 o CEO e fundador da empresa Lei Jun, informou que a Xiaomi iria mudar a sua política de preços e aumentar “não muito” os preços de seus produtos. Para referência, veja o crescimento de preços ao longo dos anos dos celulares topo de linha de cada geração:

  • Mi 8: $ 420 (fevereiro de 2018)
  • Mi 9: $ 505 (fevereiro de 2019)
  • Mi 10 Pro: $ 699 (fevereiro de 2020)
  • Mi 11 Ultra: $ 920 (fevereiro de 2021)

Mas estamos somente nos focando em celulares, hoje a Xiaomi também produz TVs, monitores, projetores, patinetes elétricos, scooters, câmeras, aspiradores, roteadores, caixas de som, fones de ouvido, smartwatches, smartbands, lâmpadas, mochilas, secadores de cabelo e cada vez mais linhas de produtos.

Isso mostra que a empresa está com um ritmo altamente acelerado de crescimento de mercado e investindo muito em diversificação, e mostra também claros sinais de desorganização, falta de planejamento e queda de satisfação.

Resumo da ópera

A Xiaomi, apesar de todos os problemas expostos, deve ser respeitada. Por méritos indiscutíveis ela conquistou seu espaço e admiração do mundo, mas hoje ela perdeu sua essência, sua transparência e organização. O dinheiro, ou acionistas, falam mais alto e essas decisões estão afetando os seus diferenciais e o que construiu a imagem da empresa.

Seus produtos continuam tendo uma fabricação com muitos superlativos, mas seu portfólio fica cada vez mais confuso. Falta clareza no posicionamento das suas marcas e o pós-venda está em níveis que beiram a arrogância, despreparo total e desprezo para com seus consumidores, criando um prognóstico muito tenebroso num curto prazo.

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